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quarta-feira, janeiro 11, 2012

Incomedido

Todos os dias acordo pensando que nasci pra amar.
Toda vez que me pego amando eu sou inteira. Mesmo que inteiramente entregue, completamente disponível. Eu amo de forma completa, incomedida. Algumas pessoas chamam de descabida a minha forma de amar, e repetem isso tanto que já quase me convenceram disso por duas ou três vezes. Mas eu nunca soube ser pelas metades, e tamanha entrega me dá prazer. Mas às vezes não cabe, e eu acabo entornando. E isso assusta quem quer que esteja dividindo o colchão comigo. 
É sempre assim. Eu sou a primeira a dizer eu te amo, a primeira a convidar pra uma festinha de família, a primeira a dar sinal de ciúmes, a primeira a perdoar, a primeira a enxergar um futuro, a primeira a enxergar o que temos em comum e o que em nós está em desacordo. Eu sou sempre a primeira a enxergar uma relação, um compromisso, uma intimidade, bla bla bla. E todo esse papo chato cansa cada cara que aparece na minha vida tentando ser amado por mim, e eu começo a apostar comigo mesma quanto tempo cada um deles vai durar. Às vezes eu penso que algum babaca covarde espalhou seu DNA pelo mundo. Mas às vezes eu converso muito com pessoas normais e acabo achando que eu to vivendo errado, fora do roteiro de uma vida saudável para os pulmões, para o estômago, para a mente, para a alma. Mas rapidinho eu me canso desse tédio todo e só consigo pensar 'pouco, pouco, pouco', e volto a procurar avidamente por um all star estiloso no meio da multidão, ou por um olhar de ressaca, ou por um telefone quieto deixado de lado num canto de mesa, ou por um pár de óculos em frente a um romance policial, ou por um café com creme duplo em cima, tentando achar uma história que bata com a minha, tentando achar a pessoa certa pra receber tanto amor.
Aí eu não encontro de novo e torno a cair nesse dilema existencial e me pergunto se eu não deveria me fingir de polida, comedida, milimetricamente controlada, racional e compreensiva, apenas pra dar a um cara qualquer o tempo que ele precisa pra me amar tanto quanto eu o amei desde o primeiro momento em que o vi. Então eu começo a rir e penso que eu nunca me contentaria.
Eu sei que só vai ser pra sempre quando ele me amar primeiro e com olhos intensos e mãos afoitas e palavras gaguejadas. E ele irá fazer tudo errado e irá derramar café em mim e irá me fazer perguntas inadequadas e irá ter pressa de tudo comigo. E irá me amar no sofá e no tapete da sala e irá cuspir um eu te amo no nosso primeiro café da manha juntos. E então eu vou saber.
Mas eu erro toda vez. Eu já caí muita vez nesse ciclo, e de contar nos dedos só faço me sentir velha. Eu penso 'tá demorando'. Aí eu me deito debaixo do edredom mais macio, me enrolo como uma criança mimada e só não faço birra porque moro sozinha e não tenho ninguém pra me adular. Aí eu aperto os olhos e oro de uma forma infantil, que é como sou capaz de me lembrar. E depois não sobra nada. Nem a bebedeira de gente grande tira de mim esse vazio que me faz querer chorar como uma criança.
Todos os dias eu durmo pensando que eu não nasci pra ser amada.

quinta-feira, janeiro 05, 2012

Verbo Amor

Eu te seduzo com palavras, te chamo por pronome possessivo, e te adjetivo todinho como eu bem entendo. Em todas as minhas orações você é o sujeito e eu não me importo quando você rasga o verbo e me faz de objeto. E quando você se dirige a mim você me subjuga, e parece não ter ideia do efeito de sentido que causa em mim. Eu me entrego aos seus recursos linguísticos, estilísticos, metalinguísticos. E é aqui, entre quatro parênteses, que nosso amor discorre nessa narrativa sensual, desta forma tão peculiar. Te amo da forma mais eterna que sou capaz: te amo com as palavras.

Guardei pra depois...

Aquela manhã estava tão cheia de Sol que lembrar de ti foi natural. Me veio a imagem de você na sua casa na praia que eu nunca vi nem foto e na minha mente você fazia pose de dono daquele oceano. E me lembrei da exata cor da sua pele, do seu cheiro e do seu jeito de pegar na minha mão. Me lembrei até da sua tatuagem clichê de um dragão no braço. Me lembrei da sua cor de canela daquele Sol quente da Bahia, do seu cheiro de mar misturado com um aroma de inocência de interior, da sua pegada forte de uma intrepidez de capital.  E você é mesmo tudo isso, essa coisa louca, é tudo em um só, só pra me fazer te querer de todas as maneiras possíveis. Me faz querer tirar o que te sobra de inocência e me desvairar na sua inconsequência. Esse jeito de Brasil afora, essa lábia internacional e esse sorriso que parece de outro planeta. Me lembrei tanto de você que quase me esqueci do que estava falando. Ah!, claro. Me lembrei das madrugadas perdidas em conversas nas quais você me fez perceber o quanto eu não sei nada de nada. Então eu ia dormir me sentindo cada vez mais burra. E me lembrei daquela noite em que você me levou pra caminhar no mar e era madrugada. E eu achei que estávamos caminhando a esmo mas você tinha preparado uma rede pra nós dois, um vinho barato e uma toalha no chão, do jeitinho da nossa simplicidade de ser, e nós falamos de tudo. E aquela noite foi tão longa que eu poderia dizer que ali se foi metade de minha vida. E como durou tanto eu me lembro de muito pouco. Mas eu me lembro de você mexendo nos meus cachos e de fingir que eu era sua. E de fingir que você queria que eu fosse sua. E você, diferente de todos, nunca me tratou como menina, mas como mulher e eu queria ser essa mulher pra você. Você sabia que eu não era assim tão inocente desde sempre. Desde aquela vez que você me chamou de bebê e eu fechei a cara. E desde aquela vez que você disse que eu tava parecendo mulher feita e eu retribui com o sorriso mais sedutor que eu consegui. E desde aquela vez em que eu tirei o vestido e fiquei só de lingerie e fingi que não sabia que você podia me ver, e você, claro, fingiu que acreditou que eu não sabia mesmo, e depois desse dia você nunca mais me olhou do mesmo jeito. Mas nessa noite foi a primeira vez em que você ousou me tocar mais ousadamente, e fez um convite disfarçado, como quem não quer nada 'bora caminhar na beira da praia?'. Mas você sabia que eu iria, é claro que sim. Você sabia o quanto eu te queria desde sempre. E por uma noite só a gente foi um do outro. Eu sabia que você não tinha nada de meu. Você não tinha nada de ninguém. Você nunca foi homem de se deixar pertencer. Eu te conheço há muito tempo, tempo suficiente pra saber mil histórias sobre o quanto você consegue ser canalha. Mas naquela noite eu fui sua. E você foi meu. E eu não me importava de explicar para o mundo que não havia razão de ser, que não havia justificativa plausível, e que nós não tínhamos nada em comum, e que você nunca seria capaz de me amar. E a verdade é que eu nunca seria capaz de lidar com a noção de você me pertencer de alguma forma, eu não saberia dividir você com ninguém, porque eu te gosto de uma forma possessiva, e detesto te ver olhando pra outras mulheres. E por isso mesmo eu não me jogaria num relacionamento tão autodestrutivo. Mas a gente foi tão bom naquela noite. Tão bom. Mas a noite acabou quando mais parecia querer durar pra sempre. E você me pediu pra ficar até o Sol nascer, mas eu te disse que isso não era possível, porque de mulher eu só tinha a vontade de você, e precisava estar na cama quando a casa acordasse. Daí você olhou e me fez jurar que eu guardaria pra ti um por-do-Sol. E hoje eu já sou mulher, pago minhas contas e cumpro com todas as minhas obrigações de gente grande. E estou esperando o dia em que você vai me ligar e pedir pelo Sol que guardei pra depois.

segunda-feira, janeiro 02, 2012

Calendário

Dois segundos de distração e me empurraram uma taça de champagne e em seguida começaram a tilintar suas taças contra as minhas. Então começaram a me abraçar e a derramar um emaranhado de palavras confusas, que recaíram sobre mim como uma grande responsabilidade, porque só conseguia ouvir palavras avulsas como sucesso, conquistas, sonhos realizados e saúde e eu não sei se dá tempo de fazer tudo em 2012. Me assustei porque nos meus planos alguns dos meus projetos levariam a vida inteira, e aí essas pessoas vieram querendo que eu dê conta de tudo em 365 dias e eu enlouqueci. E eu sempre deixei um certo espaço para as surpresas da vida, mas tudo o que eu ouvia era pessoas requerendo de mim firmeza e determinação, então eu me senti sufocada. Mas brindei e bebi e então esperei o fim da contagem, aquele momento em que tudo iria mudar e... e nada. Eu me sentia da mesma forma, com a mesma confusão, com os mesmos objetivos, com a mesma calma em viver e com as mesmas pessoas estranhas em volta. Meus amigos ainda pareciam os mesmos, minha mãe com o mesmo semblante de sempre, e aquele mesmo bando de gente estranha que pareciam iguais às pessoas que estavam na festa da semana passada, e iguais às que estavam na balada de semana retrasada. Aquele monte de gente com roupas iguais, com o mesmo jeans de marca, com o mesmo cabelinho alisado e luzes californianas, com os mesmos sonhos. Aquele consumismo moderno e aquela cultura que torna tudo descartável. Aquela mesma urgência, aquela mesma pressa de queimar etapas de suas vidinhas medíocres, pra ver quem conquista mais rápido o sonho do outro. E eu me senti tão deslocada, tão desinteressada em comemorar a virada de um dia qualquer, que se resume à troca do calendário que estava na minha parede. Como assim ano novo se meus sonhos são os mesmos? Se eu continuo querendo abraçar o mundo e ele continua não cabendo nas minhas mãos? Como assim conquistar meus objetivos se eu nem conquistei ainda meu jeito de sonhar? Se eu planejo hoje e amanhã me reinvento? A minha vida mudou tantas vezes no último ano que eu poderia ter trocado de calendário várias vezes, brindado várias vezes, me vestido de branco, vermelho, amarelo ou verde, porque minha vida recomeçou em pequenas surpresas, e se reinventou em pequenos encontros. A minha pressa não é de sonhar, não é de conquistar, não é de obter. A minha pressa é uma só, e é de viver. O que eu quero hoje eu vou atrás pra ver aonde me leva. Ou senão eu digo pra esperar e vou viver o meu tempo debaixo do cobertor ou na frente de uma tevê que não exige de mim muito o que pensar. Não tenho mais pressa de conceitos, de definições ou de certezas, já que todos esses podem ser reescritos e tudo dependerá de mim. E boa sorte aos pobres mortais que só se permitem mudar uma vez por ano, porque o relógio pra eles estará correndo. Enquanto isso eu estou aqui, e posso largar tudo, jogar pro alto e mudar a minha vida quando eu bem entender. E se precisar eu jogo fora o calendário pra não ter que olhar pra ele nunca mais. Porque eu quero sonhar quantas vezes eu for capaz.

domingo, janeiro 01, 2012

Outro pedaço de realidade escapa pelas minhas mãos.
Eu novamente me pergunto o porquê de mudar tanto.